Notícias

Consultas

05 maio 2022

O futuro do orgânico nas próximas décadas.

MENSAGEM PARA 2022

 NOS ÚLTIMOS 40 ANOS A AGRICULTURA PASSOU POR IMPORTANTES MUDANÇAS, O ORGÂNICO SEMPRE ESTEVE NA VANGUARDA DAS MUDANÇAS, DESDE O INÍCIO.

“Existe o risco que você não pode jamais correr, e existe o risco que você não pode deixar de correr.”

Peter Drucker

Botucatu, 16 de abril de 2022

Nos últimos 40 anos, a agropecuária passou por várias e profundas transformações. Em parte, por questão de autocrítica, em busca de melhorias por conta própria, e em parte – mais fortemente – por pressão do consumidor.

Historicamente (1), nos processos de desenvolvimento e em novas revoluções de transformação de tecnologias, a adesão ao processo pela esmagadora maioria dos produtores ocorre quando há uma real e convincente tecnologia que a maioria adota. Ainda não podemos dizer isso sobre a agricultura orgânica, embora haja indícios fortes de tendências de expansão em outros países, mas não no Brasil. Vejam hoje os três países com maior número de produtores orgânicos certificados cadastrados e a estimativa de mercado global abaixo. Porém, no Brasil, ainda não atingimos nem 1% dos produtores brasileiros (temos hoje aproximadamente 26.000 produtores, sendo que 1% equivaleria a 55.000 produtores). Em termos de área, mesmo estimando um total de 1,5 milhão de hectares (estimados, pois não temos dados oficiais disponíveis), temos no Brasil cerca de 20% de área dedicada à agropecuária. A agricultura orgânica no Brasil ocuparia assim 0,88 % da superfície cultivada.

Do ponto de vista monetário, estima-se, grosso modo, o faturamento com orgânicos de 1 bilhão de dólares. Comparando-se com o faturado mundialmente com orgânicos, U$ 132 bi (2), novamente temos que o Brasil participa com 0,75% do movimento global de mercados orgânicos. Comparando-se com o total do agribusines brasileiro (3), o orgânico fatura 0,83%. (4). Há o desejo, sim, em torno da agricultura sustentável ou regenerativa – mas a adesão pela maioria ainda não é a realidade. Ainda há muito o que fazer pelo orgânico!

 

  • – Thomas S. Kuhn- The Structure of Scientific Revolutions, Second Edition, Enlarged. University of Chicago, 1970. “As revoluções científicas são aqui consideradas aqueles episódios de desenvolvimento não cumulativos, em que um paradigma mais antigo é substituído no todo ou em parte por um novo paradigma incompatível.”
  • Willer, Helga, Jan Trávníček, Claudia Meier, Bernhard Schlatter (Eds.) (2022): The World of Organic Agriculture. Statistics and Emerging Trends 2022. Research Institute of Organic Agriculture FiBL, Frick, and IFOAM – Organics International, Bonn. Available at organic-world.net/yearbook/yearbook-2022.html.
  • https://exame.com/agro/recorde-apos-recorde/
  • consideramos aqui a agricultura orgânica englobando todos os conceitos, como biodinâmica, agroecologia, regenerativa, sintrópica, natural e outros.

 

Contudo, com base nos fatos relatados a seguir, podemos dizer que a agricultura orgânica sempre sinalizou, indicou, os caminhos de transformação da agricultura da atualidade, servindo como inspiração e crítica ao sistema atual. Temos, porém, que admitir com humildade que tecnologicamente ainda há muito que que fazer no orgânico!

  • A agricultura orgânica sempre priorizou a biodiversidade. No cenário micro, por meio do desenvolvimento de técnicas que priorizam a biodiversidade dos animais, dos insetos e fungos presentes no local de produção, como estratégia de manutenção do equilíbrio.

Uma das principais técnicas defendidas pelo setor orgânico foi o controle biológico, natural ou artificial, promovendo ambientes favoráveis aos predadores naturais de pragas ou com a sua introdução nas culturas comerciais. Hoje, o controle biológico representa a nova revolução da agricultura mundial, ajudando de forma eficaz e contundente a redução no uso de agrotóxicos.

Além disso, com relação aos insetos, sempre se destacou a importância de termos este organismo bem desenvolvido nas fazendas, tanto o de inimigos naturais como o das abelhas – tão importantes para a polinização e para a produtividade das lavouras, que dependem de polinização cruzada. Sem o uso de agrotóxicos, garante-se a máxima atividade e atuação desses insetos. Nos dias de hoje, a mortalidade das abelhas e meliponídeos (fato que já havia sido previsto pelos pioneiros da agricultura orgânica) é tema central de discussão sobre o futuro da agricultura, lembrando que na China já há regiões em que a polinização em frutíferas é humana e não mais realizada por insetos…pois eles já não existem mais naqueles ambientes de extremo uso de agrotóxicos.

No cenário macro, a agricultura orgânica conserva e incrementa ambientes biodiversos como matas, cercas vivas, proteção das aguadas e outros.

 

Muitos países não possuíam ou ainda não possuem uma rigorosa lei ambiental como a brasileira. A introdução de áreas de recuperação ambiental em porcentagens ao redor de 10% da área de produção foi algo que ocorreu mundialmente e trouxe vantagens claras aos produtores orgânicos. Já temos no Brasil exemplos de produção orgânica que exploram sua biodiversidade, inclusive nos campos de lavoura, para reduzir a população de insetos “praga”.

 

  • A agricultura orgânica sempre priorizou a matéria orgânica do solo, com a incorporação de composto ou com aplicação laminar superficial, por sua capacidade de aumento do poder tampão do solo, agregação de nutrientes, melhoria da estrutura do solo, promoção da vida do solo – que mobiliza e disponibiliza nutrientes às plantas. A retenção de matéria orgânica leva à retenção de carbono, fator importantíssimo para a mitigação dos danos causados pelos gases de efeito estufa, além de ajudar na adição de nutrientes ao solo, economizando o uso de adubos importados.

 

  • A agricultura orgânica, desde os seus primórdios, sempre priorizou o uso de adubos naturais e de rochas moídas. A agricultura não orgânica lança mão de calcário, uma rocha moída, para neutralização do pH do solo; a orgânica também o faz, mas além do calcário, sempre apoiou e estimulou o uso de outras rochas como fosfatos naturais, basaltos, granitos e feldspatos, ricos em minerais que, uma vez no solo, trabalhados pela biota, decompõem-se rapidamente, liberando nutrientes, ajudando a construir o banco de nutrientes do solo, promovendo a solução local de adubação e a correção de fertilidade do solo. A agricultura não orgânica criou, nas últimas décadas, uma enorme dependência de adubos importados, pagos em dólar. Com relação a esse tema, ainda teremos grandes desenvolvimentos nos próximos anos. Artigos recentes, devido à crise internacional e guerra na Ucrânia, mostram que o país Brasil está acordando para a sua riqueza natural, as rochas ígneas, sedimentares e metamórficas disponíveis para a agricultura em forma moída.

 

  • Nessa toada, a integração das culturas e criações nas propriedades rurais sempre foi a forma priorizada na agricultura orgânica. Ajuda na reciclagem de nutrientes, no conforto animal, e hoje é reconhecida no Brasil a importância da integração lavoura, pecuária e floresta como uma solução importante e decisiva para a produção de sistemas duradouros de produção, sistema esse exemplarmente defendido pela Embrapa.

 

  • A questão ainda presente na memória de todos, da vaca louca, que também já havia sido prevista pelos pioneiros da agricultura orgânica, demonstrou que as aptidões de cada espécie animal e a forma de alimentação devem ser respeitadas, criando-se mecanismos para garantir qualidade de origem e a rastreabilidade dos alimentos fornecidos aos animais. Na agricultura orgânica, a alimentação animal sempre foi totalmente rastreada. O tema da qualidade dos alimentos e sua rastreabilidade foi algo que sempre existiu na agropecuária orgânica. Rastreabilidade tornou-se o absolutamente mínimo necessário, faz parte do conjunto básico de boas praticas de produção. Sem ela qualquer processo de certificação, não somente a orgânica, se perde. Quanto mais detalhada a rastreabilidade, mas seguro se torna o processo e o produto. Com ela, consegue-se definir e segregar os problemas, os fatores de risco. Com o comercio atingindo proporções globais, transnacionais ou mesmo continentais como no Brasil, torna-se critério fundamental para o sucesso de qualquer empreendimento agropecuário. Tanto para quem produz alimentos como para quem fornece matéria prima.

 

Por causa desses fatores e de outros ainda não mencionados e que poderiam ser adicionados a esta lista, tenho a tranquilidade e a certeza de que a agricultura orgânica é uma das inspirações do caminho certo na atualidade, é desejada pelos consumidores e continuará provocando impacto na sociedade. Os itens acima fazem parte do desenvolvimento contínuo, necessário à agropecuária mundial como um todo.

Em relação à agricultura orgânica, muitos são os desafios existentes, como a criação de um sistema de plantio direto com insumos e métodos aprovados para este sistema.

“Espera-se que o tamanho do mercado global de alimentos orgânicos cresça em 2021 para 2022 a uma taxa de crescimento anual composta (CAGR- taxa de crescimento anual composto) de 14,0%. (Business Research Company). Como podemos participar e crescer com esse mercado? Seu desenvolvimento está apenas começando. É possível entender o mundo orgânico através de sua segmentação e tendências. “… Aves e Laticínios, Frutas e Legumes Orgânicos, Pão e Padaria Orgânicos, Bebidas Orgânicas, Alimentos Orgânicos Processados, Outros” (Business Research Company) é uma maneira de entender isso. Aves no Brasil, por exemplo, é um dos segmentos de crescimento mais rápido em orgânicos. O consumo de ovos orgânicos explodiu durante a pandemia, a busca por grãos para alimentar as galinhas poedeiras também. Todas as tendencias de consumo e políticas lançadas em países desenvolvidos para promoção orgânica impactam diretamente os países onde os programas são lançados, mas também o mundo inteiro. Por exemplo: ao promover grãos e laticínios orgânicos na Europa (que quer 25% de área cultivada coberta com orgânicos até 2030- https://www.foodnavigator.com/Article/2021/04/12/Europe-s-difficult-target-of-25-organic-by-2030-Is-the-Organic-Action-Plan-doing-enough ), automaticamente a demanda nos países tropicais por açúcar, café e cacau também aumenta, pois os laticínios e grãos serão consumidos acrescentando também os produtos tropicais. O mesmo vale para políticas regionais. Ao estimular-se um produto, automaticamente outros são impactados. Tudo está interligado – isso o sistema de produção orgânica já indicava desde o início. Deve-se investigar e buscar as pesquisas de mercado.

A certificação orgânica e a sustentável apoiam o caminhar nesse desenvolvimento, com critérios claros, avaliados e mantidos para produtores e processadores de produtos, com normas decididas após consultas a operadores e às partes interessadas.

O cumprimento da missão do QIMA IBD torna-se mais importante que nunca, para ajudar o planeta na busca da sustentabilidade. Podemos fazer a nossa parte!

Alexandre Harkaly

CEO

QIMA IBD