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06 jan 2020

Vinho natural é produzido no Rio Grande do Sul

Fermentado de uvas. Este é o único ingrediente descrito nos rótulos dos vinhos e espumantes da Vinícola Vivente, primeira produtora de vinho natural registrada no Ministério da Agricultura, localizada em Colinas, no interior do Rio Grande do Sul. É um passo importante dentro de um movimento que vem conquistando clientes exigentes, mas segue restrito aos porões de alguns poucos vinhateiros gaúchos.

Os 7 mil litros que estão sendo produzidos neste ano pela Vivente já foram todos pré-vendidos para restaurantes especializados, empórios e bares de vinhos de São Paulo e Rio de Janeiro. Os sócios Diego Cartier e Micael Eckert deixaram carreiras bem-sucedidas no mercado de cervejas artesanais para se dedicar ao vinho natural.

Diego trabalhava em um clube de cervejas e viajava o mundo como beer hunter. Já Micael foi um dos fundadores da cervejaria Coruja, ao lado de Rafael Rodrigues. Em 2016, a marca foi vendida, e Micael viu no vinho natural uma oportunidade para estar mais próximo da natureza: “Na cerveja, tudo é importado, padronizado. O malte é sempre igual, o lúpulo varia muito pouco. Já no vinho, tu só vai saber que uva tu tem quando estiver colhendo”.

Só é considerado vinho natural aquele produzido com uvas orgânicas e que não leva nenhum aditivo durante o processo de vinificação. As leveduras – responsáveis por transformar o açúcar em álcool – são todas selvagens, presentes naturalmente na uva. Já o sulfito, que ajuda a conservar o vinho, é permitido apenas em baixíssimas doses.

 

Instalações da Vinícola Vivente (Foto: Cristiano Borges/ Ed. Globo)

Como não é utilizada nenhuma técnica para “corrigir” o vinho, o resultado é uma bebida absolutamente fiel à uva produzida naquele ano. “O que tu mais percebe no vinho natural é a expressão da fruta, porque tu está trabalhando só com a fruta. A gente acostumou a tomar vinhos tipo Coca-Cola. São iguais de um ano para o outro, porque os fabricantes enchem de coisas para deixar o vinho padronizado”, diz Diego.

Não há dados oficiais sobre vinhos naturais no Brasil, mas estima-se que o número de produtores não passe de dez. A tendência é que esse nicho vá se expandindo junto com a produção de vinhos orgânicos (primeiro passo para o vinho natural).

Segundo pesquisa da consultoria inglesa Wine Intelligence, a comercialização de vinhos orgânicos no mundo cresceu, em média, 20% ao ano nos últimos  cinco anos. A Feira Naturebas, que ocorre há sete anos em São Paulo, é a grande vitrine dos vinhos orgânicos, biodinâmicos e naturais produzidos no Brasil.

Neste ano, foram 2 mil visitantes e 100 expositores, entre eles rótulos premiados em concursos internacionais. Mesmo assim, a maioria desses produtores não está regularizada. “Está todo mundo buscando se regulamentar, mas muitos vinhateiros não têm nem condições de fazer isso”, explica Lis Cereja, organizadora da feira e dona da Enoteca Saint VinSaint.

Os vinhos naturais (Foto: Cristiano Borges/ Ed. Globo)
As parreiras (Foto: Cristiano Borges/ Ed. Globo)

A principal reclamação dos pequenos produtores – não apenas de vinho natural – é que a lei foi formulada com base na grande indústria, exigindo muita burocracia e investimento. Já a Lei do Vinho Colonial, que criou regras mais simples para os pequenos produtores, permite a venda apenas dentro da propriedade ou em feiras da agricultura familiar.

Um impeditivo para quem tem em São Paulo e Rio de Janeiro os principais mercados consumidores. “É uma lei feita por quem não entende o mercado de vinho”, afirma Lis.

PALADAR

Na Europa, o vinho natural já uma realidade. É essa a percepção de Márcio Morelli, que vive na Suíça e é sócio da Cave Leman, importadora que trabalha apenas com vinhos naturais. “A nova geração de bebedores de vinho na Europa, a galera de 18 a 20 anos, nem sabe o que é o vinho tradicional.”

Mas, no Brasil, o produto tem um longo caminho a percorrer. Um dos entraves está na reduzida oferta de uva orgânica. Acir Boroto produz uvas orgânicas desde o fim dos anos 1980 e teve muitas dificuldades com o clima do Rio Grande do Sul.

Lis Cereja, organizadora da feira (Foto: Cristiano Borges/ Ed. Globo)

Ele conta que houve muitas perdas. “O segundo ano para mim foi o mais difícil, porque estava em transição e, quando você tira o agrotóxico, todo tipo de doença aparece. Nós tivemos problemas também com granizo. Num ano perdemos 100% da produção.”

Outro desafio é reeducar o paladar do consumidor, acostumado a um determinado padrão de vinho. “Tem de sair totalmente da caixinha em que te colocaram como sommelier, chefe de cozinha, nutricionista”, diz Lis, referência no assunto e proprietária do primeiro restaurante do país a trabalhar apenas com vinhos orgânicos e naturais.

Alexandre Tenenbaum é dono do mercado de bairro Acolheita, no Rio de Janeiro, que vende apenas vinhos naturais. Para evitar surpresas, ele ajuda o consumidor a escolher o vinho e explica por que aquele produto é mais caro que o tradicional.

No Acolheita, por exemplo, os rótulos variam de R$ 65 a R$ 185. Mesmo assim, os produtos têm feito sucesso. “O vinho fresco, natural, com pouca intervenção, especialmente os vinhos da Vivente, que são muito leves, muito tranquilos, cumprem muito com o paladar do carioca”, afirma Alexandre.

Fonte: https://revistagloborural.globo.com/Noticias/Empresas-e-Negocios/noticia/2019/12/vinho-organico-e-produzido-no-rio-grande-do-sul.html

Foto principal: Micael Eckert e Diego Cartier (à esq.) da Vinícola Vivente (Foto: Marcelo Curia/ Ed. Globo)