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14 maio 2020

Pandemia derruba vendas de produtores de leite e alimentos orgânicos no sul de MG

Queda no consumo e restrições para conter a crise causam diminuição da renda e levam até mesmo ao descarte de produtos

Benedito Rosa, 45 anos, vive da fabricação de queijo nozinho em Cambuí, município no sul de Minas Gerais. Até março, tirava 300 litros de leite, produzia em torno de 35 quilos de queijo e tinha uma renda bruta girando em torno de R$ 700 por dia. Mas tudo mudou com o avanço da pandemia de coronavírus.

“Meu comprador de São Paulo parou de vir buscar, com medo. Não tenho mais para quem vender. Essa semana joguei fora 750 litros de leite”, afirma. Ele ainda tentou doar para o hospital e o asilo da cidade, mas o temor sobre uma possível contaminação os fez rejeitarem a oferta. “Me deu um dó de jogar fora. Se continuar desse jeito, vou quebrar”, lamenta.

A alternativa para Benedito foi vender para uma cooperativa de Santa Rita do Sacupaí, cidade a pouco mais de 60 quilômetros de distância. “Mas eles estão pagando menos de R$ 0,70 o litro do leite. Isso não paga nem a ração”, conta. Normalmente, o leite é vendido na região por R$ 1,35 o litro.

Benedito é só um entre vários produtores preocupados com a falta de renda. Segundo João Rosa, presidente do Sindicato Rural de Cambuí, as nove grandes empresas que trabalham com leite na cidade fecharam as portas. “São em torno de 200 famílias de produtores em Cambuí e região que não têm o que fazer com a produção. Não sabemos o que vai acontecer”, diz.

Coronavírus em Gonçalves, Minas Gerais (Foto: Prefeitura de Gonçalves/Divulgação)
Pandemia mudou a rotina para produtores em Gonçalves (MG) (Foto: Prefeitura de Gonçalves/Divulgação)

Sensação de abandono

A falta de informação e o descaso por parte do governo federal são as queixas mais comuns entre os produtores. A 30 quilômetros de Cambuí, na pequena e turística cidade de Gonçalves, há descrença. “Não acredito que a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, vá olhar para os pequenos agricultores”, desabafa Maristella Caneppele, sócia e gerente da feira Orgânicos da Mantiqueira de Gonçalves.

O Ministério da Agricultura diz ter garantido a “manutenção da compra da produção da agricultura familiar destinada à merenda escolar, mesmo durante a suspensão das aulas”. Mas o fato é que nem todos os produtos da região fornecem para escolas da rede pública. É o caso de Benedito. “Nós nunca fomos lembrados”, afirma.

Estradas fechadas

Coronavírus em Gonçalves, Minas Gerais (Foto: Prefeitura de Gonçalves/Divulgação)
(Foto: Prefeitura de Gonçalves/Divulgação)

Outra incerteza no sul de Minas é o fechamento de acessos em mais de 65 cidades. Em muitos municípios, barreiras físicas, como manilhas e montes de terra, foram instaladas por prefeituras e até mesmo moradores. Nas rádios locais e redes sociais, a justificativa é que são medidas necessárias para conter a propagação do coronavírus.

“Todos os acessos à cidade de Gonçalves estão fechados há duas semanas”, conta o sargento Neves, da Polícia Militar da cidade. Ele ressalva, no entanto, que os produtores com suas cargas não estão sendo impedidos de passar. “Somente quem não é da região e não está identificado acaba tendo que voltar”, diz.